28/09/2009

O Capitalismo Não é Mais Aquele

O capitalismo é uma sociedade do desemprego. Que o digam aqueles que lutaram contra essa forma de produção, como Marx, por exemplo. Que o digam também os economistas burgueses amantes da verdade científica, como David Ricardo. Este gigante da Economia Política, depois de muito relutar, mudou de opinião e passou a reconhecer que o uso capitalista da maquinaria causa desemprego. Noutra época e com argumentos diferentes, Keynes via o capitalismo como uma sociedade marcada por um desemprego permanente, ainda que a níveis toleráveis. M. Kalecki argumentava que o capital exige sempre um excedente de mão-de-obra, pois num regime de permanente pleno emprego, a posição social dos empresários estaria minada e cresceriam a autoconfiança e a consciência da classe trabalhadora.A prova de que o capitalismo é uma sociedade do desemprego encontra confirmação no chão da história. De fato, o processo de formação e desenvolvimento do capital revela que o desemprego passou por três diferentes estágios. Na fase da chamada acumulação primitiva, este fenômeno surge por conta da destruição das atividades produtivas autogeridas, para dar lugar à formação de um mercado de compradores e vendedores de força de trabalho. Arrancados bruscamente de seu modo de vida, camponeses e produtores artesanais não puderam ser absorvidos pela manufatura nascente com a mesma velocidade em que eram postos no mundo. Mas, tão logo o capitalismo se afirma como modo de produção dominante, inicia-se um longo ciclo de prosperidade e crescimento econômico, com o desemprego entrando em ritmo de queda livre.A trajetória descendente do desemprego é interrompida com a Grande Depressão dos anos 30; quando milhões de trabalhadores são jogados na rua. Entretanto, a intervenção direta do Estado na produção e distribuição de certos bens e serviços recoloca a economia sobre os trilhos do crescimento, abrindo uma nova fase de prosperidade na história do capitalismo. Principalmente a partir da da Segunda Grande-Guerra, as economias desenvolvidas passaram a viver o que se convencionou chamar de a "época gloriosa do capitalismo".Nos primeiros anos da década de 70, a fase de prosperidade do "capitalismo glorioso" chega ao fim. O desemprego volta a crescer, atingindo dimensões extremamente elevadas; tão elevadas que há quem se proponha a rever o conceito de pleno emprego, com a finalidade de mudar a concepção do que se deve considerar como “nível aceitável” de desemprego. Diante desta nova realidade, não é sem razão que a OIT é obrigada a reconhecer que as políticas tradicionais de emprego e renda perderam sua eficácia.O pessimismo da OIT tem sua razão de ser: o capitalismo atingiu os limites de sua expansão histórica. Vários fenômenos conspiram a favor desta tese. O primeiro deles é o fato de que, hoje, o "crescimento econômico" se faz muito mais por meio da centralização dos capitais existentes do que pela criação ou expansão de novas plantas ou unidades de capitais. Segundo Chesnais, mais de 60% dos investimentos se dão sob a forma de fusão de capitais. Segundo, o crescimento da produção de descartáveis revela que a valorização do capital não se dá mais através da criação de novos mercados. Como assim? Ao invés de ampliar o número de consumidores, o capital reduz o período de vida útil das mercadorias, obrigando os consumidores a repô-las em prazos cada vez menores. Terceiro, a crescente financeirização da economia passa a dispensar cada vez mais a mediação da produção de valores de uso para valorização do valor. Daí o pessimismo de quem sempre apostou no desenvolvimentismo, como Celso Furtado. Segundo ele, "para manter o nível de agressividade das economias capitalistas tornou-se necessário abandonar as políticas de emprego. O aumento de produtividade se desassociou de efeitos sociais benéficos. Esta é a maior mutação que vejo nas economias capitalistas contemporâneas".No Brasil, os limites da expansão histórica do capital se dá com a construção e consolidação da matriz industrial do país na década de 70. Os anos 30 são o ponto de inflexão deste processo. É a partir de então que se dá uma realização parcial interna crescente do excedente econômico. Os anos 50 aceleram este processo. O Plano de Metas, do governo de Juscelino Kubitscheck, toma a mais sólida decisão consciente em favor da industrialização substitutiva de importação, ao levar às últimas conseqüências a construção dos estágios superiores da pirâmide industrial do país e do capital social básico de apoio a esta estrutura. O sucesso do Plano foi, contudo, relativo. Deixou atrasar o desenvolvimento dos setores de bens de produção e de alimentos. Além disto, aumentou o consumo de petróleo, ao mesmo tempo em que aprofundou a vulnerabilidade externa da economia.Somente com a ditadura militar, estes problemas foram corrigidos. Em que pese as diferenças de opiniões, e até mesmo contraditórias, o II PND completou quase totalmente o fechamento da matriz das relações interindustriais, com a implantação definitiva da indústria básica de bens de capital, de energia e de insumos básicos. Com isto o país ganhou capacidade competitiva internacional, ao corrigir os desequilíbrios externos herdados do Plano de Metas.Com a consolidação da matriz industrial esmorecem as taxas de crescimento da economia. Não é mais possível alcançar taxas de crescimento próximas àquelas do período desenvolvimentista, pois o desenvolvimento da economia está atrelado ao desenvolvimento do capital. Quando este atinge seus limites, os aumentos de produtividade não são mais acompanhados por melhoria nas condições materiais de vida da classe trabalhadora. É quando, então, a curva do desemprego cresce, com suas taxas tornando-se rígidas para baixo. Esta rigidez é alimentada por outros fatores. No Brasil, cerca de 2 milhões de pessoas, crianças com menos de 14 anos, que deveriam estar na escola, estão trabalhando ou procurando trabalho. Não só este contingente deveria estar fora do mercado de trabalho, como também 6 milhões de aposentados e pensionistas que continuam trabalhando. Para piorar a situação, mais de 3 milhões de pessoas têm mais de um emprego, o que reduz as oportunidades de trabalho para quem está chegando ao mercado pela primeira vez.Que fazer diante de tal situação? Se a tese aqui defendida é certa, já não é mais possível combinar crescimento econômico com inclusão social. Se é assim, preciso avançar para além da luta contra os efeitos negativos da acumulação de capital e reinscrever na ordem do dia, como estratégia prioritária, a luta pelo socialismo.

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