28/09/2009

Crédito Popular: Um Negócio da China?

Tempos atrás, a Caixa Econômica Federal lançou uma campanha publicitária, que trazia como mensagem o sugestivo slogan "de tostão em tostão se faz um milhão". Tradução, quase ao pé da letra, do provérbio popular "de grão em grão, a galinha enche o papo". Era isso mesmo o que pretendia essa instituição: engordar a poupança nacional, trazendo para o mercado financeiro aquela faixa de público até então marginalizada pelos grandes bancos. Se não isto, despertar o interesse do pequeno poupador para poupar mais ainda.A Caixa pode até ter falado a língua do povão. Infelizmente, permaneceu onde estava. Assim como Maomé, esperou que seus rebanhos levassem os seus tostões para depositar em suas agências. Ora, quem quer não manda recado. Foi justamente o que fizeram as seitas religiosas. Foram ao encontro do povão. Falaram o que ele queria ouvir. Conseguiram, assim, vender "pedaços de paraísos" a módicas prestações: "dê o que você puder". Deus aceita qualquer tostão, e não exige abertura de conta, nem tributa seus correntistas.Assim também estão fazendo os grandes bancos. Demorou para descobrirem que "pobre também é gente"; isto é: que é um bom investimento. Se as seitas religiosas fizeram do "comércio de almas" um grande negócio, por que não fazer o mesmo com o mercado do dinheiro? Por que não levá-lo para junto do grande público, que compra na bodega da esquina, empenhando tão-somente a sua magra aposentadoria ou sua renda incerta?Condições objetivas não faltam. O Estado institucionalizou o desconto em folha. Virou instituição legal. Doravante, os bancos podem concorrer com a antiga prática da agiotagem, que empresta dinheiro, recebendo como garantia o contra-cheque de suas vítimas endividadas, endossado por sua palavra. Concorrência desleal, pois, agora, os bancos não precisam de nada disso. Basta que o cliente, seja ele aposentado ou ativo, autorize o desconto das prestações do seu empréstimo na folha de pagamento.Mas o sistema bancário quer mais ainda. Pretende trazer para o mercado de dinheiro pessoas que não têm contracheques, aposentadorias ou conta em bancos... Pessoas que vivem às margens do mercado formal da economia.Para tanto, foi criado o banco virtual. Cabe dentro desses tipos de máquinas utilizadas nas transações com cartões de crédito. Ligadas ao sistema central de operações de um grande banco, estas máquinas contêm tudo que é preciso para fazer uma agência bancaria funcionar. Abrem conta-corrente, fazem empréstimos, transferências interbancárias... Tudo o que um grande banco faz. E com uma vantagem: não precisam de funcionários, pois são distribuídas em locais de acesso ao grande público, como farmácias, panificadoras, mercearias e outros pontos do comércio varejista. É o próprio dono desses pontos de venda que têm interesse em dispor de um banco no seu estabelecimento.O objetivo do banco virtual é universalizar o sistema bancário. Neste tipo de banco, qualquer pessoa pode abrir uma conta, receber cartão magnético, fazer empréstimo. Tudo que um grande cliente faz em seu banco. Com a diferença de que não precisa comprovar sua renda, nem tampouco recorrer a avalistas em suas operações de crédito. O banco confia em sua palavra, pois sabe que o maior patrimônio do pobre é ter seu nome “limpo” na praça.O pobre agora virou gente. O Banco Popular do Brasil está tornando isto uma realidade. Empresta dinheiro quase de graça; a uma taxa de juros de 2% ao mês, quase nada se comparada com as extorsivas taxas dos cheques especiais, que chegam a quase 10% ao mês.Esmola grande faz cego desconfiar! Um simples exercício matemático mostra que uma taxa de 2% ao mês não é tão baixa assim. Qualquer soma de dinheiro, emprestada a esta taxa, rende um ganho de 26,80% ao ano (1,02)12= 26,80%. Comparada com uma taxa de inflação 5% ao ano, o lucro real será maior do que 20%. Nada mal, principalmente se se levar em conta que o banco virtual, criado pelo Banco do Brasil, opera praticamente sem custos com mão-de-obra, sem instalações fixas, não paga energia, nem segurança. Além do mais, o dinheiro, de que dispõe para emprestar, vem dos depósitos compulsórios: percentual sobre os depósitos à vista que os bancos são obrigados a manter sob a forma de reservas junto ao Banco Central. Dinheiro captado de graça, já que os bancos não remuneram tais depósitos.Se é assim, que importa se alguns pobres deixam de honrar seus compromissos? Dinheiro captado de graça, com juros reais quatro vezes maior do que a inflação, a taxa de inadimplência é o que menos conta!ESTE ARTIGO FOI PUBLICADO PELO JORNAL O POVO, EDIÇÃO DE DOMINGO, 08/05/05.

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